Eles trabalhavam de barriga para baixo para preservar as costas, década de 1900
No início do século XX na França, afiar facas era uma profissão vital, porém extenuante, que exigia longas horas e precisão cuidadosa.
Na cidade de Thiers — famosa como o coração da produção de cutelaria francesa — os amoladores de facas desenvolveram uma técnica peculiar e prática para suportar o esforço físico do trabalho: eles deitavam-se de bruços, com o peito para baixo, enquanto trabalhavam na pedra de amolar.
Essa postura incomum permitiu que eles preservassem as costas, poupando-os da postura curvada e dolorosa que frequentemente afetava outras profissões.
Muitas vezes, um cão leal sentava-se nas pernas do moedor, aquecendo-o nos dias frios e acrescentando um pequeno conforto a uma rotina que, de outra forma, seria exaustiva. Através destas fotos antigas e raras, aprendemos um pouco sobre a vida destes artesãos habilidosos.
Apesar da falta de recursos naturais essenciais para a indústria — como minério de ferro para lâminas e arenito para rebolos — Thiers se tornou o coração da fabricação de facas francesa.
O principal patrimônio da cidade era o Durolle, um rio de fluxo rápido cuja energia abastecia as oficinas de cutelaria.
A paisagem acidentada da cidade também contribuiu; os habitantes, acostumados a trabalhar em terrenos rochosos e íngremes, trabalhavam nos campos no verão e fabricavam lâminas no inverno, com uma determinação que impulsionou a indústria.
Durante esse período, a produção de facas em Thiers mudou para uma divisão de trabalho, com especialistas se concentrando em diferentes estágios do processo, desde a modelagem da lâmina até a montagem final — uma mudança significativa em relação à época em que um único cuteleiro cuidava de todo o processo.
As condições de trabalho eram notoriamente duras. Os responsáveis pela modelagem das lâminas, conhecidos como “barriga amarela”, deitavam-se sobre as rodas de amolar, com um cachorro frequentemente empoleirado em suas pernas para se aquecer nas oficinas frias e úmidas do vale, perto do rio.
O barulho era ensurdecedor e o perigo era constante; uma roda de esmeril quebrada podia jogar um trabalhador contra o teto, muitas vezes fatalmente.
Outras etapas da produção de facas eram igualmente exigentes, já que as prensas de martelar apresentavam altos riscos e as temperaturas de forja frequentemente chegavam a 49 °C. Mesmo assim, a especialização e a eficiência de Thiers atraíam encomendas de toda a França.
Um exemplo notável foi a faca Laguiole. Originalmente produzida na vila de Laguiole, em Aveyron, a demanda logo superou a produção local, e os cuteleiros de Laguiole recorreram a Thiers em busca de ajuda.
Essas facas, antes conhecidas como “estilo Laguiole”, passaram a ser conhecidas simplesmente como Laguiole quando toda a produção foi transferida para Thiers.
Esse padrão foi repetido em vários estilos de facas francesas, que muitas vezes recebiam nomes em homenagem às cidades ou regiões que as desenvolveram inicialmente — Yssingeaux, Issoire, Alpin, Montpellier e Rouennais, para citar algumas.
Ironicamente, embora a Thiers produzisse lâminas para a maioria das regiões francesas, ela não tinha uma faca própria até 1994, quando o distinto modelo “Le Thiers” foi lançado.
Hoje, a indústria que antes era movida a água é movida a eletricidade, mas Thiers e áreas vizinhas ainda fabricam de 70% a 80% das lâminas da França.
Com um museu dedicado e a exposição internacional anual de lâminas “Coutellia”, Thiers mantém com razão seu título de capital da fabricação de facas francesa.
(Crédito da foto: Knives of France via Flickr / Ampliado por RHP).